Vou começar esse post citando algumas diferenças de três gêneros não abordados na Poética de Aristóteles com profundidade, para então iniciar uma análise da poesia iâmbica.
poesia elegíaca : escrita em dístico elegíaco, que é um hexâmetro seguido por pentâmetro. A épica é escrita em hexâmetro datílico, então, a poesia elegíaca deriva da épica. A única diferença do dístico para o hexâmetro, é que existe um pé a menos (o pé é aquilo que marca o ritmo), até Ovídio mostra a relação dos dois gêneros ao dizer: "Me preparei pra cantar as armas, veio o cupido e roubou um pé".
Novamente, cantar as armas tem relação com a poesia épica. A elegia é a poesia do lamento, sobretudo, do amor. A elegia é narrativa, usa a palavra como modo. É, na maior parte das vezes, um narrativo simples (não tem alternância da fala do narrador com a dos personagens. Só o narrador fala.). E o gênero de elocução é médio.
poesia lírica: canta os deuses, os filhos dos deuses, o vinho, pugilato e os cuidados. A lírica não tem um metro específico como a épica, que é característica pelo hexâmetro datílico. Ela é muito complexa, por exemplo: existem subdivisões dentro de cada uma dessas subdivisões de hino, epinício, etc. Então, existe o hino a Apolo, que tem um metro próprio, com ritmo próprio, dança própria. É narrativa simples. Para os românticos, é conhecida como a poesia do "eu". O termo "lírico" surge no helenismo, a partir do séc III aC, porque antes disso, eram chamada poesia mélica. Exemplos de grandes poetas líricos são Safo e Anacreonte.
Agora vou falar com um pouco mais de detalhes da poesia Iâmbica. Esse tipo de poesia tem como característica marcante, o iambo (que é um pé, ou seja, marca o ritmo). Essa poesia se associa à fala do dia a dia, cotidiana, então, é uma poesia baixa (na épica por exemplo, havia aquela valorização da escolha das palavras, o ornato, o corte de palavras, abreviações, para distanciar, justamente, da fala vulgar e cotidiana). As próprias palavras usadas são baixas, como veremos daqui a pouco. Essa poesia, como eu já disse na outra postagem, é motivada pela raiva. O meio é o simples verbo (não há ritmo, harmonia). O narrador, na maioria das vezes, não dá a palavra para o personagem como acontece na Odisseia, Ilíada, Eneida... nas quais a narrativa é mista, ou seja, há alternância. E o objeto são homens inferiores a nós. Bom, nem sempre há a possibilidade de estudar poemas inteiros, já que há a degradação pelo tempo, o desaparecimento de determinadas partes, etc. Então, nem tudo que postarei estará completo, porém, é possível fazer análises e entender do que se trata esse tipo de poesia e algumas características marcantes:
T1) "Não me importam de Giges seus tesouros,
nem me tomou inveja nem admiro
divas obras e o grande tirano não amo;
pois muito longe estão dos meus olhos."
comentário: o poeta se caracteriza como pobre. Isso tem relação com o tipo da poesia (fala cotidiana, a falta de uso de recursos para elevar a poesia, etc). Podemos perceber também uma crítica moral e política: o rei tem poder demais, ele faz um confronto dele com o tirano: um, é poderoso, rico, o outro é humilde, pobre.
T2) "e o caralho dele,
como o de um asno prieneu,
reprodutor, comedor de milho, encheu-se,"
comentário: Esse trecho é excelente pra evidenciar a baixeza de vocabulário. Tomado pela raiva, o eu lírico não diz "o membro sexual masculino", e sim, "caralho". A comparação com animais é frequente: você rebaixa a pessoa comparando-a com o caráter dos animais. Então, ao falar de mau cheiro há animais específicos, assim como para astúcia, etc. O asno por exemplo, é tomado como um animal de membro sexual imenso, ou seja, a crítica está em dizer que o homem criticado é luxurioso, vicioso, ele é o próprio membro, nada além disso. Esses temas sexuais são muito frequentes na poesia iâmbica. E dá pra supor o motivo disso pela própria história de sua origem:
Iambe era um escrava (já podemos ver aqui a origem humilde), que ajudou a divertir uma deusa que estava aos prantos porque não encontrava a filha. Iambe então, começa a fazer gracejos, mostra as partes íntimas, se toca, tentando fazer a deusa se divertir e rir. Então, as palavras de baixo calão, são usadas para proporcionar o riso, diversão.
T3) "havia muita espuma ao redor da boca"
comentário: aqui, existe um exemplo de felação (que segundo o dicionário é: s.f. Gozo sexual provocado pela sucção; coito bucal). E existiam práticas sexuais, principalmente, que eram praticadas só por escravos, mulheres, então, retratar isso sendo feito por um homem não escravo era um forma de rebaixá-lo. Novamente insisto que muitos poemas e partes de poemas foram perdidos ou degradados. Esse verso por exemplo não está composto em um contexto, não há evidências que mostrem que era um homem. Porém pelo tipo de poesia e seu objetivo, pode-se entender que não estava retratando o ato feito por uma mulher e um escravo. Provavelmente realmente está dizendo que o ato foi feito por um homem, com a intenção de manchar sua imagem.
T4) "Pai Licambes, que é isto que pensaste?
Quem perturbou teus pensamentos,
em que outrora te apoiavas? E agora pareces
ser motivo de muito riso aos cidadãos.
violaste grande juramento,
o sal e a mesa.
Esta é uma fábula dos homens:
como uma raposa e uma águia em comunidade
se uniram."
comentário: eu já contei antes a estória de Licambes, sua filha Neobula, o pacto que Licambes fez com Arquíloco para dar-lhe a mão de sua filha, o rompimento do pacto, a ira de Arquíloco refletida em seu poema e a morte do esperado sogro e suas filhas. Nesse trecho, vemos o uso de ironia em "Pai Licambes". É como se Arquíloco estivesse dizendo "era pra você ser meu sogro, meu pai também... mas você rompeu o pacto, lembra?". Ele diz que Licambes agora é motivo de riso entre os cidadãos, isso porque faltou com sua palavra, faltou com um pacto feito durante a mesa, enquanto comiam. Aqui, também são citados animais, e até uma fábula. A raposa representa o animal traiçoeiro, e a águia, um animal elevado. Agora, eu retomo algo que já disse no post anterior, mas que considero relevante também citar agora:
Aristóteles disse na Poética que a poesia iâmbica não era universal e fictícia como a comédia. Porém ao analisar o significado dos nomes vemos que, talvez, não seja tão particular, e pode sim se referir a uma ideia, a algo universal: Licambes significa "passo do lobo" (relaciona-se com a raposa da fábula, astuta). E Neobula significa "novo desejo".
Para os antigos, o instabilidade como característica da mulher é um ponto comum entre os autores. Isso é bem exemplificado no nascimento de Vênus, que ocorre onde? No mar, que é instável, muda o tempo todo de acordo com os ventos.
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